quinta-feira, 5 de agosto de 2010

O último inverno.

Lembro-me daquele dia como se fosse hoje.

Era inverno, as flores não possuíam aquela vivacidade única, o céu estava turvo, e o verde das folhas, ah o verde intenso das folhas estava fosco.

O dia marcante não é apenas um dia em que algo extraordinário acontece, ou algo inesperado, um dia marcante pode ser o dia mais simples e mais bobo da vida, um dia marcante pode ser todos os dias. O fato marcante pode ser sempre, só basta aproveitarmos cada segundo como um fato marcante. Embora, nesse dia algo inesperado tivesse acontecido.

E aquele segundo foi marcante. Eu estava sob a janela do meu quarto, observando as ruas, as pessoas com a suas rotinas e manias diárias (detalhe: detesto rotina), como o senhor que passava na banca de jornal e logo após ia tomar um café na lanchonete ao lado, ou o cara que passeava com o cachorro no mesmo horário, todos os dias, ou aquela mulher da rua que vivia com o fone de música ao ouvido, e como mais que a metade da população brasileira se isolava do mundo e das pessoas dessa maneira. Foi quando o telefone tocou, em um sobressalto fui atender, estava tão entretida com a paisagem da minha janela que me assustei. Desci as escadas correndo para atender, não sei por que estava tão apressada se nem sabia a respeito do que era o telefonema, mas sentia que era algo importante, simplesmente sentia.

Atendi ao telefone:
“Alô? Quem fala?” Era meu pai.

Ele com um tom de preocupação, como quem não sabe qual será a reação da pessoa, disse:

“Inaiara, seu bisavô está muito doente, e iremos visita-lo amanhã no hospital.” Quando ele disse isso fiquei quieta por uma fração de segundos, que parecia ser eterna. Não acreditava no que ele disse, então suspirei um:

“Está bem.”
Meu bisavô era muito importante para mim, passava grande parte das férias em sua casa. Desliguei o telefone atônita, sem saber o que pensar, e foi quando percebi que estava a uma hora pensando na notícia que meu pai havia me contado, e que logo ele estaria em casa. Resolvi ir dormir, a notícia tinha me dado sono.
Acordei no dia seguinte com meus pais me chamando, dizendo que já estávamos atrasados para ir ao hospital, coloquei a primeira blusa que achei na cabeceira o jeans que estava jogado no sofá, e fomos.

Chegando lá, minha mãe subiu primeiramente ao quarto com minha avó e meu pai, fiquei esperando no andar de baixo, foi quando meu pai desceu com o olho lacrimejando, e disse um:

“Ele está muito mal.” Então, eu subi, passei pela sala de espera e vi minha avó chorando muito, ela estava realmente mal, afinal, era seu pai. Entrei no quarto, e quando vi meu bisavô deitado naquela cama: Com os braços fracos. Os olhos fechados. A face gélida. Lembrava-me de quanta vida ele já havia possuído um dia. Foi então que minha mãe que ainda estava lá sentiu a pulsação dele, nesse momento eu disse ao seu ouvido:

“Vô? É a Inaiara.” E ele não respondia, senti que não estava respirando. E minha mãe com os dedos em seu pulso disse:

“Inaiara, chame o enfermeiro, acho que ele se foi.”

O enfermeiro entrou na sala, tentou achar a pulsação em vários lugares, nos olhou e disse:

“Ele morreu.”

Eu não acreditei no que ouvi, mesmo sabendo que tinha sido melhor para ele, afinal ele possuía 90 anos, chorei tanto, não consegui controlar, as lágrimas desciam sob meu rosto sucessivamente. Foi a minha primeira experiência com a morte.

E nesse dia eu descobri que a morte é muito mais que cinco letras.

Um comentário:

  1. Ah amiga, eu que já estive "ao seu lado" num momento triste... Me emocinei tanto ao ler este texto sobre esta situação que já me comentara...
    Meus olhos foram se enxerendo de lágrimas a cada parágrafo que fui lendo. Criando a cena em minha mente e imaginando o quão frágil você estava. E quanto mais suas palavras me preenchiam mais eu senti uma imensa vontade de ter estado contigo simplesmente para te abraçar nesse momento.

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