domingo, 6 de novembro de 2011

Vivamente morta.


"Somos mostras e amostras (...)" Teatro Mágico.

Senhora de idade, cerca de uns 75 anos, fios brancos como pétalas de rosas caiam e escorriam até a nuca, nem lisos nem enrolados, eram diferente dos outros fios, estavam ali porque nasceram ali e morrerão ali, simplesmente, e não para se exporem comparativamente aos outros cabelos. Os traços da velhice eram evidentes envolta de seus olhos - mas esses ainda vivos mostravam ao mundo o introspectivo de uma alma que lutou e cantou a cada vitória, e nas perdas declamou Lispector. Trajava um vestido branco que usava desde a juventude, ele era rendado e delineava seu corpo marcando os traços pungentes de sua adolescência, os pés estavam descalços, as mãos leves e finas sob a colcha de retalhos. Em seu semblante pairavam as lembranças da infância, as cirandas, os beijos ingênuos, os olhares cálidos de frescor. Sua boca ladina e levemente sorridente evidenciavam os amores da vida inteira.

Ela estava diferente do mundo, não era massa moldável nem amostra exposta, era altruísta, falsidade estava longe, paz permeava seu ser. A janela em cima da cama estava aberta, o sol brilhava como nunca o azul do céu era límpido. Um sorriso abriu-se em minha face no mesmo segundo que uma lágrima escorreu. O quarto era isento de obscuridade. Fitei-a por inteiro, ela era minha mulher, lindamente graciosa e distante... Estagnada, morta, porém, mais viva do que nunca. Era minha, e agora de um mundo desconhecido.
A luz entrou e pairou em cima dela, foi quando eu percebi que doía. Doeu demais.
E em sua lápide havia o inscrito: O sol pairou aqui, a chuva veio, e o escuro resplandeceu.

2 comentários:

  1. Lindo texto, Ina. A terceira idade me comove muito, muito! Muito sensível, parabéns. ♥

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  2. *-* '
    Gostei, tão lindo.
    Um dia escrevo assim rs

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